As novas narrativas dos alimentos
Da produção ao consumo: a sustentabilidade e a transparência precisam fazer parte da história dos alimentos.
Lembro-me de quando eu era criança e estava na cozinha da minha avó durante o preparo de quitutes que iriam ocupar a mesa logo no finzinho da tarde. O cheiro vindo do fogão espalhava-se por todos os outros cômodos da casa. Para ela, a alimentação era aquela que nos fazia feliz ao redor de uma mesa farta e repleta de pessoas que amamos. Cresci, mas essa memória gustativa ainda me enche a boca toda vez que ela me vem à mente. E também, com o passar dos anos, percebi que o alimento ganhou ainda mais perspectivas e valores, não só nutricionais ou emocionais.
Estive no 12º BHB Food, promovido pelo time da Equilibrium, e passei uma tarde ouvindo profissionais de diferentes áreas contribuírem com uma ampla visão deste setor. Nesse encontro, vi diferentes narrativas possíveis para um tema que ocupa espaço na casa de todos nós. Neste texto, trago uma pequena colher das reflexões das discussões que aconteceram por lá.
Para ser sustentável precisa ser acessível
Durante a fala da Lorena Coimbra, da FoodTech Consultoria, no painel “Sustentabilidade Social – Empreendedores de Alimentos na Periferia”, percebi que premissas importantes para a sustentabilidade envolvem acessibilidade e disponibilidade dos alimentos. Tornar etapas de produção, distribuição e comercialização mais próximas das regiões de consumo colabora para a economia local e garante quantidade e qualidade e, possivelmente, melhor preço em função do reduzido número de intermediários e, claro, da proximidade geográfica. Um sistema como esse dentro da periferia, por exemplo, traz ganhos, não só econômicos, como mais renda para os moradores, mas sociais (empregos próximos das residências) e, também, ambientais (redução de emissão de gases poluentes) para toda a comunidade.
E no painel “Criando um mundo de nutrição sustentável: o papel do shelf-life na redução do desperdício de alimentos”, pudemos ver que a indústria tem espaço para contribuir para que o alimento não vire lixo tão facilmente garantindo menor desperdício, tema frequente, porém, atual na agenda do setor.
Alyne Yamabe, da Kerry, que conduziu essa conversa, contou que o impacto ambiental do pãozinho é super alto, por exemplo: ele representa o equivalente a 12 banhos de chuveiro ou a extensão de 2 km de emissão de gases poluentes de um carros. Estender a vida de um alimento, com segurança, garante que números como estes possam ser reduzidos e beneficiar toda a cadeia. Além disso, ingredientes com maior validade podem contribuir com o negócio de pequenos empreendedores.
O papel do Selo
Entender que a atuação das instituições envolvidas com a sustentabilidade no setor de alimentos vai além de produzir um selo para a embalagem é uma tarefa bem grande e árdua. O consumidor, muitas vezes, vê e entende aquela pequena imagem na embalagem, o que é bom, mas precisa compreender o papel daquela organização em toda uma cadeia. Essa, entre outras discussões, estiveram na mesa-redonda “Comunicação em Sustentabilidade”, com a participação da Tania Sassioto, da EU RECICLO, a Maria Eduarda Lemos, da SBV, o Cobi Cruz, da ORGANIS e a Natasha Pádua, da UPCYCLING. Garantir que um produto é vegano, por exemplo, demanda monitoramento e atuação que só uma instituição preparada e com experiência pode fazer. Entendendo isso, compreendemos porque o mercado nacional ainda não está preparado para ter em uma única instituição que as suporte em todas as atitudes que uma empresa precisa ter para ser e comunicar sustentabilidade em sua marca e produtos. Essa foi, para mim, a grande lição da discussão que aconteceu nesse horário.
Como contador de histórias, imagino abordagens para que esses temas possam dar voz à importância dos acontecimentos que os envolvem. Suas narrativas estão fortes e vivas, acontecendo por meio das pessoas dedicadas em cada uma das frentes que pude, de forma bem sucinta, apresentar aqui.
Sigo acompanhando cada um desses movimentos e desejando que essas histórias produzam mudanças significativas que cheguem na mesa de cada um de nós.