O café é a segunda bebida mais consumida no mundo, ficando atrás apenas da água. Todos os anos são geradas mais de 60 milhões de toneladas de borra de café no mundo – é o resíduo mais abundante da preparação do café.
Brasil é o maior produtor mundial e o segundo maior consumidor de café. A borra de café é um resíduo alimentar com potencial funcional, de fácil disponibilidade e baixo custo, porém, tradicionalmente, a maior parte desse resíduo acaba em aterros.
A borra de café possui uma quantidade substancial de lipídios, fibras solúveis e proteínas de alto valor biológico. Inclusive, ela pode servir como material de base para diversos usos, incluindo adsorventes, enchimentos, aditivos para produção de polímeros, suplemento na alimentação animal e fertilizantes.
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Os desafios de trabalhar com borra de café
A valorização da borra de café tem sido muito estudada devido à abundância do resíduo, baixo custo e presença de substâncias de interesse. Porém, nem tudo são flores, para valorizar a borra é preciso viabilizar seu uso, lembre-se de que os maiores geradores são cafeterias e restaurantes e não a indústria, então a oferta é abundante, mas muito dispersa. Além disso, após o uso para fazer café, a borra é quente e úmida, então a contaminação microbiana pode acontecer em poucas horas, exigindo estabilização ou processamento rápido.
A borra de café é composta principalmente de matéria insolúvel, por isso é necessário encontrar processos inovadores para sua valorização. E foi isso que a pós-doutoranda Melania Casertano fez. Seguindo os conceitos de upcycling, ela usou diferentes metodologias, tanto físicas como químicas e biológicas, para transformar a borra de café em ingrediente prebiótico.
Imagem: Sustainability Matters
Extraindo substâncias funcionais da borra de café
No trabalho ela testou moagem criogênica, extração assistida por microondas e extração por enzima. A extração assistida por microondas foi a que levou à maior concentração de fibra solúvel e oligossacarídeos. Já a extração por enzima aumentou o teor de açúcar, a conversão de ácido clorogênico em ácido cafeico e a possibilidade de usar a borra como substrato de crescimento para microrganismos probióticos.
A combinação dos dois tratamentos levou a um aumento adicional de açúcares e do potencial antioxidante dos extratos em comparação com um único processo de tratamento.
O microondas aquece as moléculas de água dentro da célula e faz com que a água evapore e crie pressão, rompendo as paredes celulares. Isso libera substâncias úteis presas no interior da borra.
As borras de café contêm fibras solúveis, mas também proteínas e outros compostos bioativos que podem ser aproveitados. As fibras solúveis liberadas das borras de café são, entre outras, inulina e oligossacarídeos, que são prebióticos.
Próximos passos
O grupo de pesquisadores aplicou a tecnologia ao resíduo em pequena escala. Eles utilizaram cerca de cinco quilos para obter os primeiros resultados do upcycling de borra de café.
Agora que eles sabem que o método funciona, estão buscando se também podem transformar resíduos em ingredientes em larga escala, juntamente com indústrias de alimentos. A ideia é que, futuramente eles testem em um simulador do intestino humano e, dessa forma, possam descobrir se esses ingredientes têm algum efeito na composição da nossa microbiota e se esses efeitos são diferentes dos semelhantes não produzidos a partir de resíduos.
O estudo de tecnologias verdes abre caminho para uma indústria mais sustentável, se for utilizada para produzir ingredientes upcycled a partir dos resíduos da produção de alimentos, melhor ainda.
Referências: Resource, Elevier, New Atlas, Gov.br, Article: Exploitation of spent coffee ground (SCG) as a source of functional compounds and growth substrate for probiotic lactic acid bacteria